trechos retirados de
CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. 1949.
O Centro do Mundo é ubíquo. E, sendo ele a fonte de toda a existência, nele é gerada a plenitude do bem e do mal do mundo. A feiúra e a beleza, o pecado e a virtude, o prazer e a dor, são igualmente produção sua. "Aos olhos de Deus, tudo é normal e bom e justo", declara Heráclito; "mas os homens consideram algumas coisas certas e outras erradas". Eis por que as imagens adoradas nos templos do mundo de modo algum são sempre belas, benignas ou mesmo necessariamente virtuosas. Tal como a divindade do Livro de Jó, elas ultrapassam em muito a escala dos valores humanos. E, da mesma forma, a mitologia não tem como seu maior herói o homem meramente virtuoso. A virtude não é senão o prelúdio pedagógico da percepção culminante, que ultrapassa todos os pares de opostos. A virtude subjuga o ego voltado para si mesmo e torna possível a convergência transpessoal; mas, quando esse estado é obtido, o que ocorre com a dor ou com o prazer, com o vício ou com a virtude, do nosso próprio ego ou de qualquer outro? Através de tudo, a força transcendente — que vive em tudo, que em tudo é prodigiosa, que em tudo é valiosa - da nossa profunda obediência é então percebida.
Pois, como declarou Heráclito: "Os diferentes são reunidos, e das diferenças resulta a mais bela harmonia, e todas as coisas se manifestam pela oposição". Ou, novamente, como nos diz o poeta Blake: "O rugir dos leões, o uivar dos lobos, o bramido do mar tempestuoso e a espada destrutiva são porções da eternidade demasiado grandes para o olho do homem."
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